Preso por um post: por que a legislação está mais dura com calúnias no Facebook
No recente caso ocorrido no bairro do Butantã (SP)
em que as irmãs Victorazzo de 13 e 14 anos foram mortas pela própria
mãe numa condição envolta em tanta complexidade que uma avaliação
psquiátrica tornou-se primeiro passo, um leitor assinado como Leo Dias
comentou abaixo da notícia em um grande portal: “Matem essa cachorra na
cadeia”.
Há um risco muito grande nesse comportamento,
normalmente desprezado ou ignorado. A internet não só não é “terra de
ninguém” como pode trazer problemas sérios ao cobrar judicialmente a
responsabilidade de quem fala o que quer.
“Ameaça,
calúnia, difamação, injúria, são crimes ao vivo ou por meio da
internet. Aliás, essa divisão – mundo real ou mundo virtual – não
existe. O que quer que tenha repercussão e interesses jurídicos é
passível de responsabilização, sendo que no mundo virtual existe a
agravante que é a extensão do dano”, diz Gustavo Guimarães Leite, do
ZRDF Advogados. “Difamar ou caluniar alguém aos gritos no meio a rua é
uma coisa, fazê-lo na internet é outra, a dimensão do dano é
exponencial, a quantidade de pessoas suscetíveis ao ato passa a ser
muito maior, portanto a gravidade também é maior”.
Não vivemos sob um regime chinês ou mesmo
iraniano, cujo acesso ao Facebook está sendo vagarosamente permitido só
agora após 4 anos de bloqueio total. Temos liberdade para acessar,
opinar e dar pitacos em tudo o que acreditamos ser relevante. Porém
muitos passam daquilo que Obama chama de linha vermelha. “A todos é
assegurado o direito à livre manifestação, é um direito constitucional. O
que não significa que, ao exercê-lo, você possa ultrapassar
determinados limites impostos, principalmente ofender terceiros.
Configura-se ato ilícito, abuso de direito, que é passível de
responsabilização”, afirma Leite.
Engana-se ainda quem acredita estar protegido caso
o ataque não seja individualizado. “Antes de mais nada, é preciso haver
a denúncia, que pode ser de uma pessoa (para um crime pessoal – de ação
condicionada – só a vítima pode denunciar), mas pode ser movida uma
ação penal através do Ministério Público, por exemplo”, continua Gustavo
Leite.
Foi o risco que correu o estilista Alexandre
Herchcovitch. Após participar da manifestação do dia 17 de junho, no dia
seguinte seu perfil oficial do Twitter continha a seguinte frase: “Por
que não acontecem manifestações no norte e nordeste? É lá que elegem os
políticos corruptos do Brasil”. A repercussão foi tão negativa,
inclusive entre seus seguidores, que Herchcovitch saiu-se com uma
explicação ao estilo porta dos fundos, alegando que sua conta pessoal
havia sido hackeada.
Cancelou a conta, mas não evitou provar da máxima
“quem fala o que quer, ouve o que não quer” que a internet propicia com
crueldade: “Eu sugiro que o moço vá para o Senegal, onde dimensões
penianas generosas poderão aplacar eventuais desgostos políticos. Bonne
chance!”, foi postado por um leitor do G1, comprovando que dois erros
não fazem um acerto.
Mesma sorte não teve um advogado paranaense que,
trabalhando em um escritório de São Luís do Maranhão, passou a publicar
comentários em sua rede social criticando a cultura maranhense. Alegou
que o Brasil não evoluiria por causa dos nordestinos e sugeriu que as
regiões Norte e Nordeste sejam riscadas do mapa brasileiro, restando
apenas Sul e Sudeste. A Ordem dos Advogados instaurou procedimento
disciplinar contra o advogado por conduta indevida de xenofobia e ele
hoje está em vias de perder seu registro para exercício da atividade.
Na selva cibernética, as empresas também são alvos
frequentes e decisões judiciais estão ajudando a protegê-las dos
excessos. A Justiça de Piracicaba condenou três mulheres que organizaram
através do Facebook um protesto difundindo boicote à rede Habib’s, a
pagarem uma indenização de R$ 100 mil (R$ 33,3 mil para cada uma) pois a
iniciativa teve “o intuito de abalar a reputação” da empresa e a
induzir a “sociedade a não consumir os produtos por ela fornecidos”.
O que faz pessoas julgarem um suicida como
Champignon, baixista do Carlie Brown Junior, ou que defendam a
extradição compulsória de nordestinos após uma reintegração de posse
ocorrida no Grajaú à base de bombas de gás da polícia contra mulheres e
crianças é algo que deixo para a psiquiatria explicar. Já as
consequências, quem explica é a legislação. Cuidado com o que você
posta. Pode sim dar cadeia. Bonne chance.
Fonte: http://www.diariodocentrodomundo.com.br/preso-por-um-post-por-que-a-legislacao-esta-mais-dura-com-calunias-no-facebook/
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